Autor: Pedro Alves Neto
Maricota Morato, eu nunca te chamei assim: apenas Cota. Acho até que eras tão singular, que não importava o teu nome, mas o que tua existência representava para mim. Lembro-me de que suas palavras suavam como uma mensagem divina, e sua caligrafia despertavam minha vontade infantil, como que traduzindo os meus sonhos; que eram infinitamente pretensiosos. E tu como se fostes uma fada, com tua pena tocando a cada um dos meus pensamentos, como se com ela ao invés de escrita tecias uma rede que me transportaria para transformação mais significante: do meu estágio de analfabeto para de alfabético; o que de certo vinha me encher de esperança de acordar para vida numa condição melhor, competir e participar como sujeito da sociedade. Tu me deste a chave, e me ajudastes abrir a porta do mundo, me destes uma lâmpada acesa que nunca mais se apagara!
Não sei por onde andarás, não pude abraçar- te depois que também me formei profissional do ensino, de certo uma das pessoas que me ajudara escolher esta profissão fostes tu; quando segurastes a minha mão, nela colocastes a pena carregada de tinta, e num movimento não linear, fizera nascer em mim o gosto de escrever, e mais ainda do querer imitá-la, o que faço hoje; claro que não com a mesma grandeza que me fizeste mais também intencionado na possibilidade de construir pontes para outros atravessarem para este mundo encantador do conhecimento! Ainda que não leias o que para ti escrevo com muito gosto, teus filhos de certo irão saber a grande oportunidade que me proporcionaste me ensinando as primeiras letras; com tanto carinho que por quanto tempo perdurar minha vida, eu procurarei como se fosse uma forma de gratidão fazer o que a mim fizeras, com a doçura e o amor que me tratastes na minha primeira sala de aula: na casa caiada, do outro lado do rio Piancó, em Lagoa Seca.
Não sei como conseguias ter tempo! Lembro-me que cuidavas de toda luta doméstica da casa! O teu pai: senhor Pedro Morato, contratava trabalhadores diaristas, e dona Joaquina, tua mãe era muito doente! O que determinava a grande quantidade de afazeres que cabia a ti executá-los. Mas todas as vezes que lá chegávamos, tu já estavas, nos esperando, e nos acolhendo com ternura e abnegação; como que num passo de mágica, nos passava lições, um a um, atendendo o tempo de cada um dos alunos, pois a classe era composta de alunos de diversas série e idade. Impossível esquecer sua predileção em atender a todos, com individualidade e discrição. Dentre os materiais que desenvolvias estava um inesquecível: as provas elaboradas em papel almaço pautado, entrelaçada por fitas vermelhas, o que dava um tom de estética e elegância; além de ser um fator motivador de aprendizagem; também era muito bonita e bem escrita. Tão maravilhosa que não queria errar nada para não borrar aquela brochura encantadora!
No final do semestre, esta avaliação era levada a diretora do Grupo Escolar França Leite, na Cidade de Ibiara e passava por uma correção, e se houvessem acertos suficientes, nos dava uma classificação; e até uma validação para continuidade dos estudos. A maior alegria nossa e convivida contigo, quando recebíamos estas, rubricadas e carimbadas, com elogios; sentia que tua satisfação era tão intensa que nos contagiava; eu me envolvia de uma emoção tamanha, chorava e chorava! E tu me consolavas com palavras encorajadoras: “vai filho, tu vais conseguir, e ainda hei de ti ver doutor”!
Não fui tão longe!... Mas pelo menos posso passar adiante aos meus alunos estes mesmos dizeres, e nestes conselhos suponho a transformação que provocaram em mim; e os dou com a esperança de um semeador e creio que serão sementes do amanhã, nascerão e brotarão pela humanidade a fora; frutos da sabedoria e do desenvolvimento; esta corrente que passastes com muita dedicação, prometi a mim, como se em tua homenagem, jamais haverá de se quebrar. Terei sempre comigo o propósito de ajudar aos outros meninos e meninas do Brasil, assim como o que fizestes por mim: ler e escrever! Obrigado “Cota”, minha sempre lembrada primeira professora.
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